17 de fevereiro de 2008

ADI RFB n° 20/07: Industrialização por encomenda

Em 14.12.2007, foi publicado o Ato Declaratório Interpretativo da Receita Federal do Brasil (ADI RFB) n° 20, determinando que “para fins da apuração do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), considera-se prestação de serviço as operações de industrialização por encomenda quando na composição do custo total dos insumos do produto industrializado por encomenda houver a preponderância dos custos dos insumos fornecidos pelo encomendante”.

Tal dispositivo tem grande impacto sobre os contribuintes que apuram o IRPJ com base no Lucro Presumido.

Com efeito, o art. 15 da Lei n° 9.249/95, fixa que a base de cálculo geral do imposto (no Lucro Presumido) será determinada mediante a aplicação do percentual de 8% (oito por cento) sobre a receita bruta auferida. Nesta regra se enquadram os contribuintes que desenvolvam atividade de industrialização.

Por outro lado, para a atividade de prestação de serviços em geral, o percentual aplicável é de 32% (trinta e dois por cento), ou seja, quatro vezes maior do que o percentual geral.

Dessa forma, o que pretende o Fisco com a edição do ADI RFB n° 20/07 é tributar os contribuintes que desenvolvem a atividade de industrialização por encomenda aplicando o percentual de 32% sobre o total das receitas auferidas, alargando consideravelmente a base de cálculo do IRPJ e da CSLL.

Como relatou reportagem do jornal Valor Econômico, de 12.02.2008, “a mudança vai atingir os fornecedores de setores como o de eletroeletrônicos, de máquinas e equipamentos, indústria gráfica, entre outros, que preponderantemente têm matéria-prima fornecida pelo contratante”.

Contudo, acreditamos que o ADI RFB n° 20/07 pode ser desafiado perante o Poder Judiciário, sobretudo em virtude do fato de o mesmo ente tributante (no caso, a União), utilizar conceitos distintos para o IRPJ e o IPI, bem como ao limitar a competência tributária dos municípios.

De fato, segundo a legislação do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), Lei n° 4.502/64, “considera-se industrialização qualquer operação de que resulte alteração da natureza, funcionamento, utilização, acabamento ou apresentação do produto”. Neste sentido, o Regulamento do IPI, aprovado pelo Decreto n° 4.544/02, define que se caracteriza como industrialização o beneficiamento (“modificar, aperfeiçoar ou, de qualquer forma, alterar o funcionamento, a utilização, o acabamento ou a aparência do produto”), a montagem (“reunião de produtos, peças ou partes e de que resulte um novo produto ou unidade autônoma, ainda que sob a mesma classificação fiscal”), e ainda o acondicionamento ou reacondicionamento (“alterar a apresentação do produto, pela colocação da embalagem, ainda que em substituição da original, salvo quando a embalagem colocada se destine apenas ao transporte da mercadoria”).

Noutro passo, ao limitar a competência dos municípios para instituir e cobrar o Imposto Sobre Serviços (ISS), a Lei Complementar n° 116/03 fixa o que seria a “industrialização por encomenda” como sendo a “instalação e montagem de aparelhos, máquinas e equipamentos, inclusive montagem industrial, prestados ao usuário final, exclusivamente com material por ele fornecido”.

Ou seja, ao limitar a competência dos municípios, a União exige a exclusividade no material utilizado para que a industrialização configure serviço, ao passo que para definir o percentual da receita que representará a base de cálculo do IRPJ e da CSLL, é suficiente a mera preponderância dos insumos fornecidos pelo encomendante na composição do custo dos insumos.

Percebe-se, claramente, que o Fisco federal, ao editar o ADI n° 20/07, pretende se valer de dois pesos e duas medidas na definição do conceito de industrialização por encomenda. Vale dizer: um contribuinte que não se enquadre nos requisitos que justificam a exigência do ISS sobre suas operações de industrialização pode ser tributado pelo IRPJ como se prestador de serviços fosse, configurando verdadeiro paradoxo.

Por fim, relembramos ainda o que dispõe o Código Tributário Nacional, que em seu art. 110 determina que “a lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias”.

Dessa forma, entendemos serem boas as chances de o Judiciário afastar a pretensão da RFB, declarando a ilegalidade do ADI n° 20/07.

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